Após aprovação de ADEs – leia-se Ead – de forma arbitrária e antidemocrática, estudantes de Pedagogia do Centro Acadêmico, da Unifesp Guarulhos, lançaram nota denunciando o ataque e mandando um recado: Não aceitarão o Ead na Unifesp.
A nota foi lida em reunião virtual aberta dos estudantes de Pedagogia com o Departamento de Educação, realizada quarta feira, 10/06. Os professores demonstraram concordância com a nota e declaram seu apoio aos estudantes na luta contra a aprovação do Ead na Unifesp.
Foi encaminhado, no fim da reunião, que o Departamento de Educação e os estudantes de Pedagogia da EFLCH, produzirão uma nota em conjunto representando a posição do curso de Pedagogia. Posição essa que é a de reverter a decisão antidemocrática do Consu e barrar o Ead na Unifesp custe o que custar.
Reproduzimos, abaixo, nota completa do Caped:
Não aceitaremos as ADEs!
Nota do Caped – Gestão E Vamos à Luta!
No último dia 04/06, em reunião virtual do Conselho Universitário (Consu), foi decidido pelo retorno do calendário acadêmico entre os dias 06/07 e 03/08 com as chamadas Atividades Domiciliares Especiais (ADEs) – que apesar da nova sigla, representam o famigerado Ead.
Primeiramente, cabe denunciar o processo de aprovação dessas ADEs, que se deram de maneira arbitrária e antidemocrática. As opiniões das entidades e dos estudantes contrárias à implementação das ADEs foram completamente ignoradas no processo de decisão.
Essa ofensiva do Ead iniciou-se com a Portaria nº 343 de 17 de março de 2020, na qual o MEC autoriza em caráter excepcional a substituição das disciplinas presenciais em andamento por aulas que utilizem meios e tecnologia de informação e comunicação por ensino a distância. Disfarçada de solução para a suspensão das aulas em decorrência da pandemia do covid-19, o MEC tenta se aproveitar do momento em que vivemos para aplicar o principal plano do Banco Mundial para a educação pública brasileira: a privatização.
Desde a publicação da Portaria, a Reitoria da Unifesp vinha dando sinais de que cederia aos mandos e chantagens do MEC. Apesar de ter deliberado a inviabilidade e improcedência da adoção de atividades domiciliaresdurante o período de suspensão das aulas, suas justificativas foram pautadas somente em aspectos técnicos e pedagógicos. Ao negligenciar o problema político, representado pela privatização do ensino superior público, a Reitoria se colocava aberta à preparação do terreno para a implementação do Ead. Isso se confirmou após reunião do Consu realizada no dia 13/05, onde a Reitoria disponibilizou um formulário chamado “Cadastro para solicitação de internet e/ou computador/tablet” com o objetivo de levantar quais estudantes possuem ou não computador/notebook/tablet em casa.A inviabilidade de outrora, passa a ser completamente viável, desde que se garantam condições técnicas. Os aspectos pedagógicos e a natureza presencial dos cursos? A Reitoria simplesmente esqueceu-os.
É importante também que nos atentemos ao que disse a Prae (Pró reitoria de assuntos estudantis) na pessoa do Anderson, em reunião com os C.As realizada no dia 26/05. Sobre o fornecimento de acesso à internet e tablets aos estudantes, a Prae disse que não possui verba. Para isso, pedirá verba ao MEC, porém, já trabalha com alternativas para além do MEC, como a parceria com empresas de telefonia e empresas de equipamentos tecnológicos. Por um momento chegamos a pensar que quem estava falando em nome da Prae era o Weintraub, pois esse discurso é o mesmo do seu famigerado Projeto de Lei do Future-se. Não à toa, no dia seguinte, 27/05 o MEC encaminhou ao Congresso Nacional o criminoso projeto de lei. Esse PL prevê a “autonomia” das universidades captarem recursos próprios para sua manutenção, ou seja, representam a abertura aos monopólios privados através das chamadas Organizações Sociais. Coincidentemente, a mesma “solução” apresentada pela Prae. Resta ainda alguma dúvida que as ADEs – leia-se Ensino à distância – como solução para a ausência de aulas presenciais em decorrência da pandemia do covid-19 é, na prática, um caminho sem volta para a privatização das universidades públicas?
Cabe destacar que mesmo o acesso à internet e computador não é o suficiente para garantir condições de o estudante obter um ensino de qualidade de maneira remota. O ambiente de moradia também deve favorecer o processo de ensino aprendizagem no Ead, e, sabemos que, em geral, o ambiente de moradia não é adequado, sobretudo para os estudantes de baixa renda, onde uma moradia silenciosa e isolada é algo inexistente. Além do ambiente, há a problemática do acumulo de tarefas das quais os estudantes se responsabilizam dentro de casa, principalmente as mulheres que lidam com duplas, triplas e até mesmo quádruplas jornadas de trabalho.
Outro problema do Ead é a impossibilidade de proporcionar diversas atividades de extrema importância na formação do estudante as quais a universidade presencial pode proporcionar como debates, seminários, cursos de extensão, atividades culturais, aulas práticas e em laboratórios, e até mesmo, a interação com os professores pelos corredores, lanchonete e outros ambientes após as aulas.
Um aspecto importante a se levar em consideração, também, é em relação à saúde mental dos estudantes. Em pesquisa realizada pela Comissão Intercampi, foi constatado que 14% dos/das estudantes tiveram sua condição de saúde mental agravada pelo contexto da pandemia. 21,3% declararam, ainda, ter sua saúde mental comprometida pela pandemia. Vivemos um momento excepcional para a nossa geração. Temos acompanhado os números de mortos e contaminados pelo covid-19 só aumentarem a cada dia no nosso país. Isso inevitavelmente reflete na nossa saúde mental. Preocupamo-nos com nossa saúde, de nossos familiares, amigos. E ainda querem empurrar para cima da gente mais uma preocupação: a de continuar os estudos em condições precárias em meio a esse momento grave pela qual estamos passando.
Após o Banco Mundial –em relatório de1995 – recomendar o aumento da oferta de Ead no Brasil, houve um crescimento notável dessa modalidade de ensino. Em 2016 o Ead já representava 26% do ensino superior, segundo dados do Inep. No Censo da Educação Superior divulgado em 2019, o MEC já apontava que o Ensino à distância teve 7,1 milhões de matrículas em 2018, enquanto o Ensino presencial teve 6,3 milhões. Em apenas um ano, o número de cursos de educação à distância no país cresceu 50%, passando de 2.018 para 3.177, sendo a maioria das vagas oferecidas pelas instituições privadas. Das matrículas em Ead, 86% são na iniciativa privada. O grupo Kroton (Cogna Educação após as fusões), por exemplo, possui mais de 90% das matrículas no Ensino à distância.Cabe destacar que os grandes monopólios da tecnologia também enxergam com bons olhos a ampliação do Ensino à distância, pois representa uma oportunidade única de aumentar ainda mais seus super-lucros com a oferta de tecnologias da informação. Esses dados mostram a quem serve a ampliação do Ensino à distância: aos grandes monopólios privados, pois para eles, a educação é um negócio muito lucrativo.
Atendendo as necessidade das grandes empresas e corporações, suprindo-os de mão de obra barata, surge o EaD como formação aligeirada e tecnicista. O EaD reduz o papel do docente em sala de aula a mero tutor, representa o fim do debate de idéias que ocorre no espaço de sala de aula e outros ambientes da universidade. Sem o debate de idéias – pressuposto fundamental da elaboração científica, independente da área, exatas ou humanas – reinará uma única linha de pensamento, em total submissão aos mandos e desmandos do Governo Federal/Banco Mundial. É nisto que reside o pragmatismo: o fim da produção científica nacional. O conhecimento desenvolvido nas universidades brasileiras fica a serviço dos monopólios internacionais. A atual pandemia do Covid-19 escancara o prejuízo em não desenvolver produção científica a serviço do povo e da nação: falta de EPI’s, respiradores, leitos, e, milhares de mortes.
O EaD também aponta diretamente para a tentativa de por fim ao direito dos estudantes de se organizarem como movimento estudantil (C.As, D.As, DCE’s, Entidades) uma vez que nos últimos anos os estudantes tem dado exemplo de seu vigor, em lutas importantes de norte a sul. As intervenções nas universidades comprovam: a liberdade de pensamento e organização estão na mira do governo. Querem destruir as formas de organização estudantil, conquistadas heroicamente com suor e sangue do nosso povo.
Nos cursos de licenciatura isso é ainda mais grave. Não há nada mais comum que um curso rápido de licenciatura nas sub-sedes da Kroton no Brasil. Querem fazer a mesma coisa nas universidades públicas, porque sabem que professores despolitizados, inofensivos politicamente, incapazes de compreender os fenômenos sociais além da sua superficialidade, não podem prover um conteúdo crítico nas escolas. Essa dominação político-ideológica é parte fundamental do plano das classes exploradoras de destruir os direitos do povo, de jogá-los cada vez mais na miséria. Se nos atacam é porque representamos uma ameaça aos seus interesses. Esse é o nosso papel: Ser uma ameaça aos privatistas! Ser uma ameaça aos tubarões da educação! Para isso, temos que defender a educação pública, gratuita e de qualidade com unhas e dentes.
É importante compreender o prejuízo que representa o Ead, para refletirmos sobre a fala da Prae na reunião citada, que disse que não podemos ficar um ou dois anos sem aulas porque haveria um tremendo prejuízo social. Ora, e o prejuízo social que teríamos com o Ead e todos os problemas que ele carrega? O Ead irá trazer um grande número de evasão, pois está claro que muitos estudantes não conseguirão acompanhar as aulas de forma adequada. Além disso, e o prejuízo social que teríamos com a privatização das universidades públicas? Será que ficar sem aula durante esse período excepcional na história da humanidade, representa um prejuízo maior do que perder a universidade pública e de qualidade? Disseram que vão suprir isso buscando incluir ao máximo possível os estudantes com dificuldades financeiras.Cabe apontar: não há Ensino à distância inclusivo, porque universidade privatizada é paga. Geralmente com mensalidades que endividam os estudantes por muito tempo. Ainda que esta não seja a realidade imediata, a abertura de contratos com empresas de hardware e software, representa a entrada das multinacionais na UNIFESP. Em outras universidades onde este processo já se intensificou, as bolsas de IC e pós-graduação são financiadas por grandes monopólios empresariais e internacionais, que orientam diretamente as pesquisas dos estudantes para seus interesses. E claro, na razão inversa, a redução ou extinção de bolsas públicas de pesquisa, que garantem o direito dos estudantes ao conhecimento e do nosso povo à ciência.
De acordo com o Comitê de Enfrentamento do Coronavírus na Unifespe outros especialistas, dificilmente haverá condições para uma plena retomada de atividades presenciais no segundo semestre de 2020, em decorrência da pandemia do Covid-19. Diante disso, o que a universidade deve fazer?
O modelo atual de universidade possui um tripé essencial: ensino, pesquisa e extensão. Nesse momento em que não podemos realizar atividades de Ensino presencias, cabe ao MEC e à Reitoria disponibilizar recursos para atividades de Pesquisa e Extensão. Há inúmeros exemplos de como podemos colocar nossa universidade à disposição das famílias mais pobres, aquelas mais afetadas pela pandemia, seja com pesquisas que medem o impacto do momento atual em suas vidas, como com ações de solidariedade para ajudá-las a se protegerem do covid-19. Estão aí formas efetivas de evitar o prejuízo social da falta de aulas presenciais. Não queremos manter o semestre a todo custo, com ensino à distância, à custa da precarização da nossa formação, como se o papel da universidade pública fosse vender e distribuir certificados. O papel da universidade pública é produzir conhecimento científico e colocá-lo a serviço do povo.
Aproveitemos, também, para denunciar a postura do DCE (Diretório Central dos Estudantes). A Prae disse que em reunião exclusiva com o DCEconversaram sobre como lidar com a distribuição dos equipamentos. Na mesma reunião, o DCE disse ser necessário tomar alguma atitude em relação à possibilidade de com a volta às aulas presenciais em 2021 termos duas turmas de calouros, que isso seria muito prejudicial. Posição que corrobora com a implementação do Ead para “evitar prejuízos”. Talvez o DCE ache que a privatização da universidade pública não seja um prejuízo, assim como Weintraub e Bolsonaro. Não por acaso, em Live transmitida pelo próprio DCE, uma representante da gestão declarou abertamente que a entidade NÃO é contra o Ensino à distância. Não precisava nem dizer: todos nós já percebemos. Essa postura é uma traição aos estudantes que tem se mobilizado de diversas formas para travar uma luta duríssima contra o EaD.
O Consu pode ter aprovado o Ead na Unifesp, mas nós, estudantes dizemos: NÃO ACEITAMOS NEM ACEITAREMOS O EAD! Não abaixaremos a bandeira histórica da luta do movimento estudantil em defesa de um ensino público, gratuito, democrático e científico! Não entregaremos nossas universidades aos privatistas de bandeja.
Exigimos que a decisão do Consu de implementar as ADEs seja revogada e que a suspensão do calendário acadêmico seja mantida. Mais, esperamos que os professores voltem a traz em suas decisões. Que percebam que as ADEs hoje representa os interesses de Weintraub e Bolsonaro para nossa educação. Esperamos que os professores tomem posição ao lado dos estudantes, na defesa do ensino público, gratuito, científico e democrático e a serviço do povo.
ABAIXO AS ADEs E O EAD NA UNIFESP!
CONTRA O FUTURE-SE: DEFENDER A AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA!
CONTRA A PRECARIZAÇÃO E A PRIVATIZAÇÃO: DEFENDER A UNIVERSIDADE PÚBLICA COM UNHAS E DENTES!